Publicação compartilhada do site DESTAQUE NOTÍCIAS, de 13 de julho de 2023
Os esquecidos da Revolta do 13 de Julho
Por Eduardo Marcelo Silva Rocha *
A Revolta do 13 de Julho parece estar se perdendo da memória popular. Os fatos ocorridos naquele longínquo 1924, que se insere entre os movimentos de 1922, que somente se fez vitorioso em 1930, são menos lembrados do que o Bairro que leva seu nome em Aracaju, nossa capital. Não precisamos buscar motivos pois a memória é assim mesmo.
É fato que os historiadores não se esquecem, mas os caprichos da memória são tão verdadeiros que, para reforçar, quando buscamos lembrar do 13 de julho, tendemos a nos direcionar à figura de Augusto Maynard Gomes, apesar de o líder do levante em terras de Serigy ter sido não o então Tenente, mas sim o Capitão Eurípedes Esteves de Lima. Enfim, caprichos.
Independente de qualquer apreciação possível acerca do desencadeamento da industrialização que deu-se à partir da Revolução de 1930 – que carregou, como dito, algum DNA do Tenentismo – o fato é que o mote daqueles Oficiais idealistas era o fim da República Velha e do seu atraso estrutural que fazia do Brasil uma grande fazenda na organização social do mundo.
A derrota de 1922, do levante dos 18 do Forte no Rio de Janeiro (os 18 do Forte, não o bairro 18 do Forte!) pouco arrefeceu o ânimo daqueles jovens e o viés ficou em latência, descambando novamente em julho de 1924, em São Paulo, com a “revolução esquecida”, no dia 05 do citado mês, que durou 23 dias até ser debelada, após a capital paulista ser bombardeada através de artilharia aérea e terrestre.
No mote das primeiras notícias imprecisas sobre o êxito do levante em SP, o 28º BC, como dito, foi tomado pelos Oficiais sob comando de Eurípedes, após esse fato, os revoltosos seguiram e tomaram o Palácio do Governo (hoje Palácio Museu Olímpio Campos) e, incontinenti, o Quartel da Força Policial (Museu da Gente Sergipana).
É nesse ponto que gostaria de focar maior atenção, pois em que pese a destruição causada em São Paulo no combate das tropas legalistas contra os revoltosos de lá, quando se fala em centenas de mortes e mais de mil imóveis atingidos pelas peças de artilharia, o mesmo não se deu por aqui em nossas terras. Mesmo contando com o deslocamento do destroyer “Alagoas” que chegou na Barra de Aracaju, por mais de uma vez, mas sem haver feito nenhum ataque ou tentativa à capital.
Apesar, ainda, de terem os revoltosos cavado trincheiras e manejado canhões antigos (centenários, coletados abandonados no bairro Santo Antônio e recuperados nas oficinas da empresa ferroviária) diz-se que houve somente um disparo na frente de batalha formada na região do Carmo (Carmópolis) e Rosário do Catete, sem maiores intercorrências, não há de falar em destruição na capital sergipana minimamente próxima ao que houve na capital paulista.
Mas não por isso, considerando os fatos que foram mais amenos ou o próprio capricho da memória que faz esquecer Eurípedes, devemos buscar lembrar dos que merecem ser lembrados.
Quais seriam, nobre amigo, os que sem enquadrariam nessa categoria?
Dentro do contexto histórico e de memória, deveríamos lembrar das baixas que ocorreram naquela madrugada de 13 de julho, quando duas vidas se perderam. Houve outros que se feriram, até mesmo que morreram no contexto posterior, como Zaqueu Brandão que teria sido vitimado por febre tifóide, pelo menos 2 outros homens morreram.
Eram 2 integrantes da Força Pública – hoje Polícia Militar.
Quando o primeiro grupo de revoltosos sob o comando do Ten Soarino atingiu o Palácio do Governo, travou-se tiroteio com o efetivo policial que lá guarnecia, sob o comando do Tenente Stanley da Silveira por uns 40 minutos, até a rendição.
Nesse tiroteio, morre o Anspeçada – antiga classificação intermediária entre Soldado e Cabo – José Mathias de Castro.
No decorrer dos eventos, após a tomada do Palácio, o levante se volta ao Quartel da Força Pública, que pouco poder de resistir e, após curta refrega, rende-se.
O saldo deste curto combate foi a morte do Anspeçada José Rodrigues de Oliveira.
Se Eurípedes, Capitão, foi sobreposto na memória por Augusto Maynard Gomes, o que dizer de dois outros militares de baixa patente, derrotados? Não há a quem se cobrar, apesar de haver muito o quê.
Não pretendo debater aqui sobre certo e errado ou qualquer outra questão que seja contaminada pelo anacronismo. Pretendo aqui trazer à tona esses dois nomes. Esses 2 homens.
Sinto-me no direito de chamá-los de heróis, torcendo pelo reconhecimento que até onde sei, nunca tiveram. E do qual ninguém, hoje, tem culpa.
Temos sim a responsabilidade, esses homens morreram no cumprimento do seu dever. Morreram numa época em que morrer de morte matada era um evento. Na pouca incidência, se morria de faca, ainda menos, de arma de fogo. Impensavelmente, morrer de tiro de fuzil, arma até dia desses inalcançável aos não integrantes de forças armadas
Não parece, para melhor expor o respeito aos 2 colegas abatidos, que o então Batalhão Policial se preparasse em sua rotina para lutar a luta que foram obrigados. Tanto hoje, quanto á época, as forças policiais não são – e nem devem ser, frise-se – páreo ao combate com uma força militar de guerra. Assim, como diz Maynard, citando Clausewitz, quanto maior a ambientação do soldado com a guerra, maior será seu desempenho no campo, havendo escuridão, o soldado habituado logo se adaptará e conseguirá a orientação mínima. O modelo de policiamento que temos hoje surgiu em fins dos anos 1960, antes disso as funções das Forças Policiais Militares estaduais eram bem diversas do que conhecemos, mas certamente não eram preparadas sistematicamente para um ataque daquela magnitude. Ambos os prédios eram alvos iluminados na escuridão de uma noite de 1924. Pior ainda: por atacantes em maior número, melhor armado e melhor treinado.
Assim, hoje é dia também de fazermos justiça e resgatarmos as duas figuras esquecidas pela memória do 13 de Julho.
Toda a deferência aos Anspeçadas José Rodrigues de Oliveira e José Mathias de Castro.
P.S. No contexto das tropas legalistas que foram mobilizadas para combater o levante, enviaram-se tropas de Bahia e Alagoas. No contingente de Alagoas compunha-se o então Capitão Jose Lucena de Albuquerque Maranhão, um dos grandes inimigos do cangaceiro Lampião e que viria a ser o Comandante do Batalhão Policial responsável pelo combate ao banditismo em Alagoas, quando da morte de Lampião pela Volante alagoana, em Angicos/SE, no ano de 38;
Um dos Sargentos integrantes da inssurreição, Rodomarque Barros de Mendonça, tornaria-se subcomandante da Força Policial Sergipana, nos anos 30, então Major.
* É tenente coronel da PM/SE e membro da Academia Brasileira de Letras e Artes do cangaço. (eduardomarcelosilvarocha@yahoo.com.br)
Texto e imagens reproduzidos do site: destaquenoticias.com.br
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