domingo, 12 de janeiro de 2020

Sergipe, um celeiro de escolas musicais

Banda Musical Luiz Ferreira Gomes
Foto: Prefeitura de Maruim

Publicado originalmente no site JORNAL DE MARUIM, em 21 de dezembro 2014

Sergipe, um celeiro de escolas musicais

Por José Vieira da Cruz
Doutor em História Social pela UFBA/Prof. da UNIT/SEED/SEMED

A música, combinação entre silêncio e sons, é uma arte dinâmica e comunicativa. A beleza e a expressividade fazem parte de suas formas, quer sejam elas folclóricas, líricas ou clássicas. Ela é uma linguagem universal que atravessa o particularismo dos idiomas, melhora e congraça espíritos sensíveis e habilidosos. O amor à música, por vezes, faz homens e mulheres se reunirem em torno de suas letras, melodias e sinfonias. E em torno deste objetivo se articulam seus praticantes, ouvintes e admiradores. Podem ser citados como exemplos, dessa natureza, as filarmônicas, as bandas, as liras e as orquestras. Denominações diferentes para instituições responsáveis pelo enlace de músicos, maestros e do público em torno da cultura, educação e profissionalismo.

Apesar de Sergipe está se notabilizando nacionalmente, especialmente nas últimas décadas, como “o país do forró”. Em razão do seu rico e diversificado campo cultural no qual os festejos juninos são expressões consagradas, também é um traço característico de suas raízes culturais ser um celeiro de instituições musicais cuja tradição é centenária. As apresentações dessas instituições em procissões, momentos comemorativos, solenidades oficiais e momentos de descontração já fazem parte constitutiva da cultura histórica estadual.  O cinema nacional reconheceu e utilizou essa tradição no filme “Orquestra dos meninos”, aproveitando cenários e atores locais para contar a história de um maestro, apaixonado pela música, e que via na realização de seu sonho uma alternativa cultural e profissional para jovens do agreste nordestino. Não obstante a narrativa da produção cinematográfica ter sido inspirada em fatos reais ocorridos em outro estado, no que tange à paixão pela música, a importância e a tradição das escolas de música em Sergipe, reservadas suas particularidades, envolvem um rico mosaico de narrativas. Contá-las nestas breves linhas seria um ato insano e desmerecedor.

O grande número de bandas, filarmônicas, liras, associações e orquestras têm apontado o estado como um celeiro musical responsável pela formação de compositores, instrumentistas e maestros que atuam, tanto no cenário local como para além de suas fronteiras. Vocação musical evidenciada, em maior ou menor intensidade, desde o século do século XIX, em vários municípios.  Além de Aracaju, Capital do Estado, e das bandas de instituições militares, municípios como Aquidabã com a “Filarmônica Lira Senhora Santana”, Arauá com a “Filarmônica Municipal Nossa Senhora da Conceição”, Barra dos Coqueiros com a “Filarmônica Municipal de Barra dos Coqueiros”, Boquim com a “Lira Santana”, Brejo Grande com a “Filarmônica Municipal de Brejo Grande”, Campo do Brito com a “Filarmônica Municipal Nossa Senhora de Boa Hora”, Capela com a “ Filarmônica Nossa Senhora da Purificação”, Carmopólis com a “Associação Musical  Teotônio Neto”, Cristinópolis com a “Associação Musical Aprobex”, Estância com a “Sociedade Musical Lira Carlos Gomes”, Frei Paulo com a “União Lira Paulistana”, Gararu com a “ Filarmônica Eutichio Alves da Cruz”, General Maynard com a “ Filarmônica  Municipal General Maynard”, Indiaroba com a “Nossa Senhora de Indiaroba”, Itabaiana com a “Filarmônica Murilo Braga” e a “Filarmônica Nossa Senhora da Conceição”, Itabaininha com a “  Filarmônica  Nossa Senhora da Conceição”, Itaporanga com a “Filarmônica Municipal de Itaporanga”, Japaratuba com a “ Filarmônica Euterpe Japaratubense” e a “Sociedade Cultural Santa Terezinha”, Lagarto com a “ Lira Popular”, Laranjeiras com a “Filarmônica Municipal Coração de Jesus”, Malhador com a “Filarmônica Jacinto Figueiredo Martins”, Nossa Senhora da Glória com a “Banda de Música Nossa Senhora da Glória”, Nosso Senhora do Socorro com a “Filarmônica Municipal de Socorro”, Pirambu com a “Filarmônica Municipal de Pirambu”, Poço Verde com a “Lira Santa Cruz”, Porto da Folha com a “Banda de Música Antônio Carlos du Aracaju”, Propriá com a “Filarmônica Santo Antônio”, Riachão do Dantas com a “Filarmônica Nossa Senhora do Amparo”, Riachuelo com a “ Filarmônico Tasso Martins Bezerra”, Ribeirópolis com a “Filarmônica Municipal  de Ribeiropólis” e a “ Associação Musical Pedro Paes Mendonça” , Rosário do Catete com a “Filarmônica Luiz Ferreira Gomes”, Salgado com a “Filarmônica Municipal de Salgado”, Santo Amaro com a “Filarmônica Municipal de Santo Amaro”, São Cristóvão com a “Filarmônica João Batista Prado” e a “Associação Musical Genero Plech”, Simão Dias com a “Associação Musical Lira Sant’Ana”, Tobias Barreto coma “Filarmônica Imperatriz dos Campos”, Maruim com a “Filarmônica Euterpe Maruinense”, entre outros municípios, possuem ou já possuíram algum instituição musical.

Por esta razão, a regência dos acordes deste ensaio alimenta-se de algumas pesquisas já realizadas sobre o assunto em Sergipe. Na carona desses trabalhos, a primeira nota, o dó, é dada por Acácia da Silva que em seu estudo sobre o “Museu da Música de Itabaiana” destaca a importância da “Filarmônica Nossa Senhora da Conceição”. Instituição musical considerada uma das mais antigas em funcionamento no país, e reconhecida, também, como instituição de utilidade pública nacional por resguardar uma parte da música brasileira a partir do seu acervo e da trajetória dos seus componentes.

Neide Santana da Silva nos brinda com uma segunda nota, o ré,  ao resgatar no passado da cidade de Laranjeiras, entre o final do século XIX e o desenrolar do século XX,   a existência de pelos menos  cinco bandas de música: A Santa Cruz, a União dos Artistas, a do Comércio, Nossa Senhora da Conceição e a do Sagrado Coração de Jesus. Silva em seu trabalho sobre as “Memórias Musicais: a trajetória da Filarmônica Municipal Coração de Jesus” revela a importância cultural e social desta filarmônica para a formação cultural e educacional de jovens talentos locais. Não destoando desta melodia, Himpácia Gonçalves Costa Bezerra em seu estudo sobre a “Filarmônica Tasso Martins Bezerra”, em Riachuelo, ao discutir a contribuição dessa instituição enquanto agência de fomentação cultural, educacional e profissional, faz soar a terceira nota, o mi.

Uma quarta nota, o fá, escreve-se semanalmente, aos domingos, no programa “Hoje é dia de retrata” apresentado pelo jornalista Jairo Alves de Almeida. Sua preocupação e sensibilidade para com o resgate e divulgação das escolas musicais dos municípios sergipanos traçam um panorama das bandas, filarmônicas, liras, associações e orquestras em atuação. Destaca os talentos musicais e, sobretudo, estimula a valorização dessa tradição em Sergipe.

Nos trabalhos em apreço verifica-se o esforço, a dedicação e desafios daqueles que se aventuram pelas veredas musicais em terras sergipanas. Esforço ora reconhecido pelos órgãos públicos e empresas privadas, ora subsumidos pela política e o jogo de interesses pessoais. Mas, para além de transitórios obstáculos, a produção musical destas instituições é nas palavras do maestro, propriaense radicado no Rio de Janeiro, Antônio Guimarães, uma brisa que passa como uma ondulação do ar com fragmentos divinos. Suas palavras captam em grande medida o significado que essas escolas representam. Para ele “sem música a vida será um erro sem alegria”.

Optando por resgatar essa alegria, mas não desejando cometer omissões e erros. Neste ensaio, tocamos algumas notas desta melodia, esperando provocar, quiçá, iniciativas outras para alargar o conhecimento das experiências do rico passado musical em apreço. Passado cujos dilemas no presente e expectativas em torno do futuro, destas escolas musicais e de sua importância para a educação e cultura em Sergipe, devem ser repensados. Pois não basta considerar as notas musicais isoladamente, é preciso considerar, também, o jogo infinito de arranjos que as narrativas sobre elas podem proporcionar para o conhecimento histórico e cultural do Brasil a partir de Sergipe.

FONTE: CRUZ, José Vieira da. "Sergipe, um celeiro de escolas musicais". In: Jornal da Cidade. 14/03/2010. Disponível em: http://www.jornaldacidade.net/2008/noticia.php?id=58040

Texto e imagem reproduzidos do site: jornaldemaruim.com

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