Publicado originalmente no site Catraca Livre, em 09/03/2015
O verdadeiro Birdman é sergipano
Por Heitor e Silvia Reali, do site Viramundo e Mundovirado
O cenário é real. Serra de Itabaiana, Sergipe. Ali, distante
50 quilômetros de Aracaju, aninha-se a casa do verdadeiro Birdman. Ele não é
personagem de HQs, nem de seriados de TV. Não levita, não voa e nem tem
músculos fortes, aliás é bem magrinho. Nunca ganhou o Oscar, mas merecia levar
todos os prêmios. E mais, sabe tudo sobre as aves. Ele é José Percilio Costa.
A cena do nosso primeiro encontro com o birdman, oops,
Percilio, é daquelas que fazem a gente pular umas 20 casinhas no jogo da vida.
Descrevo-a tal como a vivenciei: em um plano aberto para o
máximo de paisagem, à nossa frente estavam as montanhas. Dependendo da luz que
dançava entre elas, ora eram de um dourado tom sépia ora verde azulado. Em
nossa direção caminhavam, em meio a uma vegetação rasteira de arbustos
retorcidos por ventos secos, uma galinha pardacenta, um urubu e uma seriema. O
trio compunha o inusitado séquito de um jovem magro que sorridente vinha nos
receber.
Fazendo voos rasantes um imponente carcará sobrevoava sua
cabeça. Quando me aproximei para cumprimentá-lo, zuuuuum ... abaixei rápido a
cabeça, pois uma coruja surgiu do nada para me bicar.
"Curcur não faça isso", pediu ele com voz fanhosa,
e a ave imediatamente se bandeou vigilante para uma estaca.
Não foi preciso esperar pela segunda imagem para perceber
que estávamos num lugar incomum. É preciso cuidado para relatar as histórias de
Percilio, 36, criador do Parque dos Falcões, onde a irrealidade não dá
refresco.
Sua vida baseia-se no amor aos pássaros, no mérito em
dedicar-se de corpo e alma ao seu ofício, e de segurar a barra, pois a ajuda
dos órgãos oficiais é insuficiente.
A história do nosso birdman começa 30 anos atrás. Ele era um
menino franzino, tinha problemas para se expressar, gaguejava, era fanho, e não
se interessava pelos estudos. Só por passarinhos. Seu maior sonho era ter um
falcão. Aos sete anos ganhou um ovo dessa ave e conseguiu convencer o irmão
deixar que a galinha deste chocasse. Após 21 dias todos os pintinhos eclodiram,
menos o tal ovo. Percílio implorou para que ficasse por mais alguns dias sob a
galinha e após uma semana, no dia de seu aniversário, nascia na palma de sua
mão, Tito, um falcão carcará. Nascia ali também uma grande amizade, parceria e
união de almas.
"Tudo que aprendi foi com meu professor carcará. Tito
(Polyborus plancus) me ensinou que ovos de falcões eclodem com 28 dias, que
gafanhoto é ótimo para problemas digestivos, que a gordura do sapo é eficaz
contra infecções, que a respiração boca a bico é necessária em casos extremos,
que é possível fazer implantes de bicos e ossos, e que se as aves forem
adestradas ainda jovens não mais se acasalam, pois seu parceiro passa a ser o
treinador. Tito enfim me mostrou todos os segredos da arte da Falcoaria. A maior
diferença é que em todas as falcoarias do mundo, sendo as mais famosas as
orientais, as aves são condicionadas pela recompensa com alimento, enquanto eu
troco a comida por carinho. Assim consigo em quinze dias o que outros
treinadores só realizam em seis meses", relata Percilio.
Percilio e o biólogo amador Alexandre Correia cuidam do
Parque dos Falcões que hoje abriga mais de 350 aves de diferentes espécies. O
parque é local de acolhida de aves machucadas, abrigo e treinamento de aves de
rapina para apresentação de voo livre, para defesa pessoal, controle de fauna
em aeroportos ou companhia.
Conhecer José Percílio, Alexandre e os falcões Tito, Chorão,
Xaraque, Pimpão, a seriema Lambreta, o urubu Romualdo, o socó-boi Nicinho, as
corujas Curcur e Lucinha, o anu Virgolino, a galinha chiadeira Bronquite,
comprada por pena e que chocou os ovos dos gaviões Dara, Dedé, Pimpão, Coragem,
Jurubeba e Azuma, e o insólito Mutante, meio galinha-de-angola, meio pavão, foi
como entrar em uma arca de Noé exclusiva de alados.
PARQUE DOS FALCÕES
Onde: Povoado Gandu II, BR-235, km 46, Sergipe
Horário: Todas as visitas devem ser previamente agendadas e
ocorrem somente às 9h e às 14h
Tel.: (79) 9962-5457/9885-2522/9131-3496
Texto e imagens reproduzidos do site: catracalivre.com.br
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