Publicado originalmente no site ASN, em 14 de Março de 2018
Conheça as manifestações culturais do Largo da Gente
Sergipana
As esculturas que representam o folclore sergipano e que
estarão em evidência no Largo da Gente Sergipana, são de autoria do artista
plástico Tati Moreno
Em comemoração ao aniversário de Aracaju, o governo do
Estado inaugurará no próximo sábado (17), o Largo da Gente Sergipana. Projetado
pelo arquiteto e urbanista Ézio Déda, o Largo se traduz em um movimento de
valorização da cultura popular do estado. No espaço, localizado em frente ao
Museu da Gente Sergipana - além do píer, de uma área de convivência e de um
atracadouro -, estarão expostas oito esculturas de representações folclóricas
sergipanas: Lambe Sujo e Caboclinhos, Chegança, Cacumbi, Taieira, Bacamarteiro,
Reisado, São Gonçalo e Parafuso.
O projeto é uma realização do governo de Sergipe, por meio
da Secretaria de Estado da Infraestrutura e do Desenvolvimento Urbano (Seinfra),
da Companhia Estadual de Habitação e Obras Públicas (Cehop), do Instituto
Banese e da Secretaria de Estado da Cultura (Secult). No total, estão sendo
investidos R$ 6.425.530,80, sendo a parte do governo na obra R$2,2 milhões, e o
valor restante referente aos recursos de patrocínio do Banese, que possui
linhas próprias para esse tipo de investimento e não podem ser utilizadas em
outras finalidades de governo.
“Eu acho que essa vai ser a obra que irá marcar muito a
nossa cidade. É o mais belo presente de Aracaju no seu aniversário. Vai ser a
marca de Aracaju, para o Brasil e para o mundo. Vai projetar muito a nossa
cultura popular, oferecer a oportunidade para se discutir a origem e a nossa
raiz popular, nas suas diversas manifestações. Quem ama Aracaju quer vê-la cada
vez mais bela. O Largo homenageia e celebra a origem e a raiz da nossa cultura
popular. Estou extremamente feliz pela beleza da obra, pelo trabalho de Ézio,
do Banese e o trabalho de Tati Moreno. No passado, fez-se uma obra para receber
o imperador. No presente, nos entregamos um monumento à cultura para homenagear
o povo em suas diversas manifestações”, disse o governador Jackson Barreto em
uma das suas visitas à obra.
Representações culturais
A obra, além de se tornar um novo cartão-postal da capital,
contribui para o reconhecimento e exaltação da cultura popular em Sergipe. Cada
peça representa um movimento artístico presente no estado e que ultrapassa
gerações. Para a historiadora e educadora Josevanda Franco, o Largo da Gente
Sergipana se configura em um investimento não apenas cultural, mas de cunho
educacional.
“Do ponto de vista da preservação da memória cultural, o
Largo tem um valor inestimável. Na realidade, a cultura popular tende a ficar
concentrada mais no âmbito das comunidades onde elas existem e dificilmente a
gente tem oportunidade de trazer esses elementos para o grande público. O Museu
da Gente Sergipana está colocando fora - para que todos tenham acesso, dentro
de um espaço urbano, de possibilidades de visitação e apreciação -, esse grupo
de manifestações, danças e folguedos como os mais representativos do estado. É
fundamental que a população tenha acesso a esse tipo de informação. O
investimento na Cultura significa investir em Educação. E quando a gente
investe em Educação a gente cria possibilidades de gerações que consigam
compreender melhor o valor desse arcabouço histórico que acaba se manifestando
através da cultura popular”.
As esculturas que representam o folclore sergipano e que
estarão em destaque no Largo da Gente Sergipana, são de autoria do artista
plástico Tati Moreno. O projeto foi inspirado nas esculturas dos Orixás,
localizadas no Dique do Tororó, em Salvador, e que recebem a assinatura do
mesmo artista. Confeccionadas em fibra de vidro e resina de poliéster, cada uma
das esculturas tem 7m de altura e para a instalação foram utilizadas vigas
metálicas, o que dá a impressão de que as peças flutuam acima do espelho d’água.
Além delas, o Barco de Fogo também será destaque no projeto do Largo da Gente.
A educadora e pesquisadora de Cultura Popular Aglaé D’Ávila Fontes e a
historiadora e educadora Josevanda Mendonça Franco realizaram um estudo
aprofundado sobre as expressões artísticas em evidência no projeto, e a partir
dele foi possível descrever um pouco sobre cada manifestação.
Lambe-Sujos e Caboclinhos
A festa que acontece sempre mês de outubro data de antes
mesmo da abolição da escravatura e é muito comum nos municípios de Laranjeiras
e Itaporanga D’Ajuda. Nela se apresentam dois grupos, que através de uma
dramaturgia forte retratam o combate entre negros e índios. O folguedo começa
com a luta dos índios para resgatar sua princesa que foi roubada pelos negros.
Além dos combates, o canto e a dança enriquecem a dramaturgia, que tem seus
personagens definidos. De um lado estão os Lambe-Sujos - que recebem esse nome
por pintar o corpo com carvão pisado e cabaú -, que têm como personagens o Rei
Africano, a Princesa, os Embaixadores, a Mãe Suzana, o Pai Juá, o Feitor, os
Tocadores e os brincantes, que vestidos com calções e gorros vermelhos têm nas
mãos uma foice.
Do outro lado, os caboclinhos, constituídos pelos índios,
com o corpo pintado com roxo-terra, se vestem com saiotes de penas coloridas e
cocar. Complementam a caracterização o arco e a flecha. Entre os personagens se
distinguem o Chefe, a Princesa, os Embaixadores, Tocadores e Brincantes. Com
grande beleza estética, o folguedo ganha ritmo através do batuque que marca o
passo dos cantos e das danças.
Reisado
Inspirado no costume de louvar o nascimento de Jesus com
cantos e danças, a manifestação teve origem em Portugal e chegou ao Brasil
através da colonização. Por lá, a festa começava no Natal e se encerrava na festa
de Santos Reis. Conhecida por Reseiras, aqui no Brasil a festa passou a se
chamar de Reisado e tem o Nordeste como território de referência. Os cantos e
danças são bem presentes na folia, na qual participam elementos humanos,
fantásticos e animais. Entre esses elementos se destacam a Borboleta, o
Guriatá, o Bambu, a Cigana e a Camponesa, além dos elementos fantásticos que
são Boi e o Jaraguá. Todos eles são conduzidos pelo Mateus ou Caboclo, que
divide com a Dona Deusa, o desenvolvimento do folguedo. Além deles, os
tocadores animam com as músicas que são extraídas dos instrumentos como
sanfona, bumbo, pandeiro, triângulo e, em casos especiais, acompanhados de um
cavaquinho.
O louvor ao santo é bem difundido em Portugal e no Brasil
está presente em diversas regiões. Aqui em Sergipe, existem grupos do folguedo
nos municípios de Itaporanga D’Ajuda, Laranjeiras, Pinhão, Poço Verde, Riachão
do Dantas, São Cristóvão e Simão Dias. Trata-se de uma dança ritual, com
registros na Bahia datados de 1718, destinada inicialmente para pagamentos de
promessas feita a São Gonçalo. Mas além da devoção, existem algumas lendas
envolvendo a história do santo, sendo uma delas a de que antes de se tornar
frade franciscano, ele foi marinheiro e resgatava mulheres do pecado.
Desta forma, o folguedo tem como chefe do grupo o Patrão,
vestido como marinheiro. Na cidade de Laranjeiras, a imagem do santo é
carregada dentro de um barquinho pela única mulher do grupo, a Mariposa. Os
brincantes são exclusivamente homens e usam sobre a calça, saias coloridas e
longas, blusas rendadas e xale enfeitado com fitas de várias cores. Na cabeça,
um lenço branco adornado com fita vermelha. Pulseiras, colares e brincos
finalizam o figurino, remetendo um aspecto feminino ao grupo, relembrando as
mulheres salvas pelo santo. Mesmo se tratando de uma devoção a um santo
português, o folguedo apresenta no louvor a forte presença africana, observada
na música, na dança – embaladas por instrumentos de corda e percussão - e em
palavras do dialeto africano inseridas nas letras.
Taieira
Inicialmente chamada de Talheira, a festa já acontecia na
Vila de Nossa Senhora da Purificação e Santo Amaro, na Bahia, em festejos
importantes como nas comemorações pela celebração do casamento de Dona Maria I
com Dom Pedro III, de Portugal e Algarves, realizado em junho de 1760. A festa
recebe forte influência africana, ligada ao culto nagô e se apresenta como
louvor aos santos protetores dos negros, Nossa Senhora do Rosário e a São
Benedito. Trata-se de uma dança-cortejo de intenção religiosa e acontece nas
festas de seus santos de devoção, no Natal, Ano Novo e dia de Santos Reis.
Nesta festa, a rainha das Taieiras é laureada, com a coroa de Nossa Senhora do
Rosário, pousada sobre sua cabeça, pelo Padre, durante a missa.
A caracterização do grupo se dá nos trajes vermelho e
branco, adornados com laços de fitas coloridos, chapéus brancos igualmente
enfeitados com fitas e flores vermelhas, e nas mãos as varetas, feitas de
madeira, forradas com papel colorido e flores, ou ainda pequenas cestas
enfeitadas com fitas e flores. Os personagens que se destacam no folguedo são o
Ministro, o Rei, a Rainha, as Guias, as Lacraias, os Capacetes e o Figural ou
Patrão. São destacados os grupos dos municípios de Japaratuba, Lagarto e
Laranjeiras.
Cacumbi
Acredita-se que a folia seja resultado da evolução e junção
de elementos de outras danças e folguedos. Pode ser encontrada em vários
municípios brasileiros, com várias identificações a depender da região.
Originalmente o Cacumbi remete a uma luta entre um rei negro e um chefe
caboclo, sempre vencido pelo rei. Também em homenagem aos padroeiros dos negros
São Benedito e Nossa Senhora do Rosário, o grupo é composto apenas por homens,
que obedecem ao som marcante e ao apito que coordena os passos, vestidos com
calça branca e camisa amarela. Os personagens são o Mestre, o Contra-Mestre e
os dançadores e cantadores. É possível reconhecê-los pelos chapéus enfeitados
com fitas e espelhos. Costumam se apresentar nas procissões de Bom Jesus dos
Navegantes e no dia dos Santos Reis. Existem grupos nos municípios de
Itaporanga D’Ajuda, Japaratuba, Lagarto, Laranjeiras, Maruim e Riachuelo.
Bacamarteiros
Bacamarteiros
O termo bacamarteiro ou bacamartista trata-se de uma
denominação militar do integrante da infantaria do Exército Imperial
Brasileiro, destacado na Guerra do Paraguai, referindo-se ao soldado que
manuseava o bacamarte, uma arma de fogo de cano curto e largo, carregada com
pólvora seca e com um poder de fogo mortal. Com o fim da guerra e o passar do
tempo, o bacamarte se tornou um instrumento de defesa pessoal e das
propriedades, principalmente no nordeste brasileiro. Já no período junino ele é
utilizado como um desafio à valentia. Formado por homens e mulheres, o grupo é
formado pelos Atiradores, o Mestre do Apito, as mulheres cantantes e dançantes
do Samba de Coco, o Tirador de Versos ou Coqueiro e os Tocadores, que se ocupam
dos pandeiros, ganzás, reco-recos, onças ou ronqueiras. Os grupos estão
presentes nos municípios de Capela, Carmópolis e General Maynard.
Parafuso
Grupo folclórico do município de Lagarto, o Parafuso tem
inspiração no tempo da escravidão, quando os negros fugitivos roubavam as
anáguas das sinhás que estavam no quaradouro. Cobrindo todo o corpo com as
peças, os negros saíam em noite de lua cheia pulando e dançando em busca de
liberdade. Desta forma, criou-se a superstição e nenhum senhor saia à noite de
casa com medo da assombração. Com a libertação dos negros, eles continuaram a
tradição. As anáguas brancas que formavam um contraste com sua pele negra
chamaram a atenção do vigário de Lagarto, o padre José Saraiva Salomão, que
comparou o movimento dos brincantes ao de um parafuso, observando o rodopiar no
sentido anti-horário, parecendo, assim, torcer e distorcer. O grupo é
exclusivamente composto por homens, que representam os negros escravos, e
seguem trajando as anáguas, cantando e dançando pela cidade ao som do triângulo
e tambores.
A dança se baseia na luta entre cristãos e mouros, com
origem nas antigas tradições ibéricas e inspirado em romances que narravam
aventuras marítimas de embarcações como a nau Catarineta. No Brasil, recebe
vários nomes diferentes a depender da região. Entre os personagens destacam-se
no grupo dos cristãos o Piloto, o General, o Almirante, o Vice-almirante, o
Mestre, o Contramestre, o Capitão-tenente, os Gajeiros, os Calafatinhos, o
Padre e os Marinheiros. Já os mouros são representados pelo Rei, os
Embaixadores, as princesas Floripes, Angélica e Dama de Ouro. Os cantos também
compõem a apresentação acompanhada por pandeiros, caixas e apitos, além do
trincar das espadas.
Texto e imagens reproduzidos do site: agencia.se.gov.br
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